Rui Car
05/04/2017 09h30 - Atualizado em 05/04/2017 08h29

Guerrero Paz e Amor estende a mão até a Rodrigo: “Tivemos papo legal”

Peruano apresenta versão "carioquês"

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Globo Esporte

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sombra paulista ficou para trás. O Guerrero do Fla, enfim, parece em casa no Rio de Janeiro. Deixou no passado as brigas com o ex-desafeto Rodrigo – a quem respondeu com cotovelada após apertão nos peitos num clássico com o Vasco em março do ano passado – e mostrou que leva no bom humor a relação com o zagueiro vascaíno. Às vésperas de novo duelo com o rival e de jogo da Libertadores, o peruano está mais leve. E tem melhor início de temporada da carreira.

 

 

Guerrero em versão Paz e Amor

O calor do Rio de Janeiro não o assusta mais. Está adaptado à Cidade Maravilhosa, ao “carioquês” e tira de letra, ainda com a timidez que o caracteriza, nomes de pontos turísticos e músicas da moda do sertanejo e de funk. É novo adepto também do “rubro-negrismo”, com mensagens carinhosas aos torcedores até quando serve à seleção de seu país.

 

Em 20 minutos de entrevista, o peruano falou do carinho pela família, pelos seus cavalos, lembrou momentos difíceis na Alemanha e até revelou episódio de racismo sofrido no campo nos tempos de Europa. Como ninguém é de ferro, sobrou leve provocação a Luis Fabiano: Guerrero pediu para a reportagem conferir a estatística no confronto com o vascaíno, adversário neste sábado. Confira isso e bem mais no bate-papo com o jogador de 33 anos.

 

Você voltou do Peru, com dois gols, um deles muito importante contra o Uruguai, e soma nove em 2017 em 12 jogos. O ano tem sido especial tanto no Flamengo quanto no Peru?

Eu não acho que seja tão especial. Espero que seja melhor ainda. Sempre trabalho para estar bem, graças a Deus neste ano me preparei para estar bem. As coisas estão acontecendo como eu imaginava. Ao final do ano quero ver quais objetivos consegui para fazer minha autoavaliação que sempre faço em todos anos. Agora estou me sentindo bem e as coisas estão saindo do jeito que planejei. Acho que poderiam ser até melhores, mas ainda falta muito e estou treinando e me preparando para essas semifinais que vamos pegar agora. Estou trabalhando muito forte para encarar esses jogos com alta intensidade, porque temos o objetivo de ganhar tudo nesse ano.

 

Durante a Copa América de 2016, falamos com um profissional de saúde que te acompanha há um tempo. Contou que você perdeu peso, ganhou massa muscular e se equilibrou mentalmente. Isso fez diferença no seu desempenho?

Recentemente falei dos trabalhos que estamos fazendo aqui no Flamengo. A gente tem uma academia muito boa, a preparação mudou muito, e acho que todo mundo está se sentindo bem, não só eu. Fisicamente estamos correndo muito bem.

 

 

Um colunista do jornal inglês “The Guardian” disse que você estaria no Barcelona se fosse brasileiro, argentino ou uruguaio. Foi um elogio, evidentemente. Você concorda? Se coloca entre os melhores atacantes do mundo?

Eu não estou vendo se estou ou não (entre os melhores). Só tento fazer o meu melhor. Para isso, tenho que me preparar bem. Senão eu não consigo estar feliz. Se não estou bem fisicamente, não consigo render o que posso. Graças a Deus, estou muito bem, me adaptei a esse calor. Não é fácil jogar nesse calor. Morei na Alemanha 10 anos, lá era frio e tinha neve. São Paulo às vezes sai um calor assim, mas não é tão abafado quanto o Rio de Janeiro. Demorei muito a me adaptar a isso, mas graças a Deus me acostumei e encaro os jogos de forma tranquila e sem problema algum

 

Sábado vocês enfrentam o Vasco. É o único time que você não fez gol entre os grandes rivais do Rio de Janeiro. Isso te faz alguma falta?

Não sinto falta. Só quero ganhar (do Vasco).

 

Luis Fabiano deu entrevista bem-humorada quando chegou, lembrou que era mais velho e tinha mais gols que você. Como é essa relação? Vocês já se enfrentaram algumas vezes né.

Nos enfrentamos muito mesmo. Já ganhei muitas vezes dele (risos). Podem ver as estatísticas: quem ganhou mais jogos. Ele pelo São Paulo, eu, pelo Corinthians. Mas não quero discutir quem ganhou mais. Vejam nas estatísticas (risos).

 

Nota da redação: são 10 confrontos entre Guerrero e Luis Fabiano – nove pelos clubes, um pelas seleções. Guerrero venceu cinco vezes Fabuloso no clássico Corinthians x São Paulo, contra duas vitórias de Luis Fabiano e dois empates nos confrontos paulistas. Brasil e Peru empataram por 1 a 1, em Lima, em 2007. Nos confrontos, Guerrero marcou três vezes, e Fabuloso, duas.

 

Guerrero disputa bola com Rodrigo (Foto: André Durão)Guerrero disputa bola com Rodrigo (Foto: André Durão)

Guerrero disputa bola com Rodrigo (Foto: André Durão)

 

Está com saudade de encontrar o zagueiro Rodrigo?

(Risos) Ah, essas rusgas que a gente tem em campo são legais, são fortes… Já falei para ele no último jogo, “não vai botar a mão aí que você vai ser castigado, vai ser punido, hein”. Aí ele fica: “é verdade, verdade”. Mas já tivemos um papo legal agora.

 

Você falou que “botou a mão aí”. Aonde?

Cara, vocês já sabem o que ele gosta de fazer. Aí eu falei para ele, “cara, você é viado?” (risos).

 

 

Você parece mais adaptado ao Rio. Já está até com cavalos por aqui também.

Tenho três. Eles até já estrearam. Faltam correr ainda outros.

 

E quais os nomes? Em São Paulo, você colocou alguns em referência ao Corinthians. Pacaembu, Coringão…

Aqui no Rio é difícil mudar o nome. No Peru, por exemplo, eu tenho o “Rubro-Negro”. No Peru quando você compra, pode botar o nome. Aqui tem que pagar uma taxa pra mudar o nome.

 

É comum aqui no Rio vermos senhores de idade apostando no Joquéi, em casas de apostas. O Guerrero vai ser assim no futuro?

Meu pai que é assim. Eu não aposto, eu vou ver as corridas dos meus cavalos. Os cavalos são como a minha família. É como o meu filho jogando bola que vou assistir.

Você tem relação muito bonita com a dona Peta, sua mãe. Como é essa relação?

Tenho relação forte com meu pai também. Com os dois. É que minha mãe é muito protetora, como se fala aqui é mãe coruja. Sou muito ligado aos meus pais, estou sempre falando com eles.

 

Dona Peta contou que o Gerd Müller, ex-craque alemão, que o treinava no Bayern de Munique, o presenteava com chocolate a cada gol. Aprendeu muito com ele?

Aprendi muita coisa. Fazia as finalizações com ele e trabalhávamos muito cruzamento de cabeça. É uma pessoa muito legal, muito tranquila. Ele era assistente do meu treinador, o Hermann Gerland e que era assistente do Guardiola. Os dois me ensinaram muita coisa.

 

Você ainda tem esse costume de comer chocolates depois dos gols?

Eu gostava nessa época, o frio te faz comer chocolates (risos). Aqui no calor não.

O que mudou no Guerrero da Alemanha, aos 17 anos, para o de hoje, de 33?

Eu era mais moleque, mais menino e muito mais novo. Cheguei muito jovem no Bayern de Munique. Agora tenho 33 anos, acho que amadureci muito. Dentro do campo também há muita diferença, me sinto mais experiente. Mas sou o mesmo, tento ser mais brincalhão com meus companheiros, sempre estou zoando mais os moleques, que ficam mais bravo, mais p… eu ia falar… (risos). Isso não mudou.

 

Guerrero e o momento que jogou garrafa em torcedor: racismo foi a causa (Foto: Reprodução)Guerrero e o momento que jogou garrafa em torcedor: racismo foi a causa (Foto: Reprodução)

Guerrero e o momento que jogou garrafa em torcedor: racismo foi a causa (Foto: Reprodução)

 

No fim de sua passagem pelo Hamburgo, houve dois problemas: você jogou a garrafa num torcedor (veja acima) e deu carrinho forte no goleiro. Por que teve essas atitudes?

A falta não foi nada. Dei um carrinho, e o cara continuou jogando depois. A garrafada, o cara me xingou, era uma pessoa racista. Eu havia machucado o joelho e fiquei oito meses sem jogar. Entrei só 10 minutos, porque era o segundo jogo depois da lesão. A pessoa começou a me xingar, porque eu era de cor. Nessa época tinha pouco latino. Ele estava me xingando muito, e eu estava com muita raiva, então eu fiz isso.

 

Guerrero acerta feio goleiro no campeonato alemão: atacante tem início de temporada mais calmo do que em 2016 (Foto: reprodução)Guerrero acerta feio goleiro no campeonato alemão: atacante tem início de temporada mais calmo do que em 2016 (Foto: reprodução)

Guerrero acerta feio goleiro no campeonato alemão: atacante tem início de temporada mais calmo do que em 2016 (Foto: reprodução)

 

Seus filhos moram na Alemanha né?

Diego e Alessio moram na Alemanha. Minha filha (Naella) mora no Peru. Com Alessio eu estive em dezembro. Ele foi me ver e ficou um tempo comigo. Diego é mais velho, já viaja sozinho, está vindo agora. A gente ia passar o Natal e Ano Novo junto, mas ele não conseguiu vir. Mas agora vem porque tem férias. E toda vez que vou ao Peru, estou com minha filha.

 

Seu José e Dona Peta: pais de Guerrero são a paixão de atacante do Flamengo (Foto: Reprodução)Seu José e Dona Peta: pais de Guerrero são a paixão de atacante do Flamengo (Foto: Reprodução)

Seu José e Dona Peta: pais de Guerrero são a paixão de atacante do Flamengo (Foto: Reprodução)

 

É a parte mais difícil da profissão? Deve sentir muita falta deles.

Muita (falta). Mas toda vez que estou perto deles tento dar 100%. Não estou para ninguém mais. Muitas vezes as pessoas não entendem isso. Por exemplo, quando vou ao shopping com minha filha. Todos querem tirar foto. Eu falo, “me desculpa.” Tento tirar uma ou duas fotos. “Quero dar 100% de atenção para minha filha.” O pessoal muitas vezes fica chateado.

 

O que sente falta de não ter feito na vida por começar a carreira tão cedo e fora do país?

Meus amigos na escola sempre saíam, iam para festas de 15 anos, lá se diz “Quinceañera”. Eu não ia. Mas eu não sentia falta. Eu não ia porque não queria. Queria ficar focado no futebol. Não me arrependo de nada. Já me privei de muita coisa, mas porque queria. Não porque alguém me exigia.

 

O filme da sua vida inspira muitas crianças no Peru. Em quem o Guerrero se inspirava?

Sempre tentei focar nas coisas que o Ronaldo Fenômeno fazia. Era minha inspiração. Não fui assim de ter pôster na parede, mas os jogos que tinham dele, sempre assisti.

 

Guerrero em ação pela Libertadores: em 2017, ele marcou nove gols - sete pelo Fla e dois por sua seleção (Foto: André Durão )Guerrero em ação pela Libertadores: em 2017, ele marcou nove gols - sete pelo Fla e dois por sua seleção (Foto: André Durão )

Guerrero em ação pela Libertadores: em 2017, ele marcou nove gols – sete pelo Fla e dois por sua seleção (Foto: André Durão )

 

O auxiliar do Gareca disse à imprensa argentina que chegou a sugerir sua ida para o Boca Juniors num momento ruim seu pelo Flamengo. Houve algo disso?

Não acompanho muito a imprensa. Não falaram comigo e não leio imprensa. Não assisto televisão. Se assisto, é jogo do Flamengo.

 

Mas pensou efetivamente em sair em algum momento do Flamengo? Você parecia chateado. Houve cobranças de torcedores também e irritação sua em jogos. Houve a procura da China recente também.

Nunca tentei sair do Flamengo. Sempre chegavam propostas, isso eu sabia. A gente (ele e os empresários) discutia isso. Mas minha intenção sempre foi ficar aqui. As outras ofertas que já tive, inclusive quando cheguei aqui, 20 dias depois, discutimos. Mas nunca foi algo que chegou perto de acontecer. Afinal de contas, fiquei aqui.

 

Você tem escrito muito “Mengão” nas redes sociais. Hoje, você é mais íntimo com a torcida, com o clube, com a história do Flamengo?

É porque eu escuto muita gente “vai, Mengão, vamo!” (grita), então eu também chamo assim. É uma coisa carinhosa para o clube. “Vai, Mengão” eu também chamo.

A gente percebe, nesse papo, o quanto você já está mais à vontade no Flamengo. No futuro, você quer ser lembrado como o Guerrero do Flamengo, como ficou marcado no Corinthians?

Não estou pensando nisso. Eu não sei. Não sei nem se vou ser lembrado também. Não fico realmente pensando nisso.

 

Você tem contrato até metade de 2018. O Flamengo já manifestou desejo de renovar com você? O que você está pensando neste momento, em ficar, sair?

Não sei, meus empresários que veem isso. Claro que gosto de estar aqui, gostaria de ficar aqui. Estou muito feliz, já estou carioca. Falando carioquês (risos). Mas eu deixo isso com meus empresários, procuro focar só no futebol, não dou muita atenção para isso (renovação), porque acho que depois pode desconcentrar, fica pensando em outra coisa… Tento focar numa coisa só, que é treinar bem e jogar bem.

 

Guerrero versão 2017: mais solto e em casa no Flamengo (Foto: Gilvan de Souza/Divulgação Flamengo)Guerrero versão 2017: mais solto e em casa no Flamengo (Foto: Gilvan de Souza/Divulgação Flamengo)

Guerrero versão 2017: mais solto e em casa no Flamengo (Foto: Gilvan de Souza/Divulgação Flamengo)

 

Guerrero ouve mais sertanejo ou reggaetown?

Reggaetown. Mas gosto dos dois. E tem o funk também, que curto um pouquinho (risos).

 

Por fim: o que te encorajou a bater falta? A gente via você treinando e batendo muito bem faltas, mas no jogo não batia.

Na verdade, sempre fui assim. Todo mundo pega a bola, todo mundo quer bater falta. E eu não gosto de brigar muito no campo (com meus companheiros). Gosto de brigar com os zagueiros, esse é o meu trabalho, mas com meus companheiros não. Quero que eles se sintam bem comigo, tenham confiança. Quando alguém pega a bola, não reclamo. Mas agora estão me cobrando muito: “você tem que bater, tem que bater, tem que bater”. Meus companheiros falam também: “pega a bola e bate”. Então hoje eu pego a bola para bater. Mas não gosto de discutir dentro do campo.

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