Rui Car
02/12/2017 08h15

Polêmico e influente: dirigente afastado pela Justiça tem papel ativo no Botafogo

Vice de estádios Anderson Simões está há nove anos na política do clube

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Globo Esporte

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Já viram a boca de urna? Nelson (Mufarrej, candidato da situação) em primeiro, branco em segundo, nulo em terceiro e Marcelo (Guimarães, da oposição) em quarto. Já pode acender o charuto?”, brincava Anderson Simões com a imprensa, na reta final da eleição do Botafogo. A cena do dirigente comemorando a vitória de sua chapa mostra um pouco da personalidade do vice-presidente de estádios alvinegro, afastado do cargo pela Justiça na última sexta-feira, suspeito de envolvimento com torcidas organizadas em investigação da operação “Limpidus”.

 

Personalidade

Apesar de avesso a entrevistas e de não gostar muito de aparecer, o dirigente tem um perfil irreverente. É falar em algum evento e ele já promete levar belas mulheres para animar o ambiente, em tom de brincadeira. Com esse estilo brincalhão e pró-ativo, conquistou os jogadores e toda a diretoria do Botafogo, que está ao seu lado neste momento delicado que envolve uma investigação policial. Mas que tipo de trabalho ele é responsável?

 

Simões é um cara para lá de participativo internamente. Foi ele a engrenagem principal da construção da Arena Botafogo, na reforma do Luso-Brasileiro, na Ilha do Governador, no ano passado. Enquanto o Flamengo, “herdeiro” do local, levou meses para conseguir estruturar o palco para receber jogos na atual temporada, a diretoria alvinegra se gabava o usando como exemplo de como se levantar um estádio com segurança e agilidade.

 

Anderson Simões em uma de suas raras entrevistas no Botafogo (Foto: Vitor Silva/SSPress/Botafogo)Anderson Simões em uma de suas raras entrevistas no Botafogo (Foto: Vitor Silva/SSPress/Botafogo)

Anderson Simões em uma de suas raras entrevistas no Botafogo (Foto: Vitor Silva/SSPress/Botafogo)

 

A costumização do Nilton Santos nas cores preta e branca no início do ano, o que agradou a torcida e fez do estádio a casa alvinegra, foi um projeto dado como de sucesso graças ao vice-presidente. Ele que pesquisou até achar um jeito de pintar as cadeiras sem que a tinta saísse na chuva, evitando comprar assentos alvinegros e barateando os custos. As “gloriosas”, as cheerleaders ou animadoras de torcida nos jogos da Libertadores, também foi ideia sua.

 

Em entrevista certa vez ao GloboEsporte.com, o presidente Carlos Eduardo Pereira usou o termo “tinhoso” para se referir a Simões, no sentido de ser um cara inquieto, que faz tudo, que resolve. Mas é também dono de temperamento impulsivo. Que bate de frente para defender os interesses do clube. Já quase saiu no braço com Marcelo Frazão, hoje diretor de novos negócios do Flamengo, na época em que era do Consórcio Maracanã e se reuniu para negociar com o Botafogo.

 

Influência

Simões está há nove anos na política do clube. Apareceu ao lado de Mauricio Assumpção na reunião em que decidiu pela união com Marcos Portella em chapa única na eleição de 2008. Mas ele ficou apenas alguns meses na gestão e saiu por divergências internas, junto a outros dirigentes. Virou oposição ao lado de Carlos Eduardo Pereira, sendo um dos mais combativos do ex-aliado Assumpção.

 

Simões Simões

Simões “cercou” Carlos Augusto Montenegro nas eleições de 2014 (Foto: Gustavo Rotstein)

 

Falando em eleição, na de 2014, quando CEP venceu, ele teve um papel importante de “cercar” o ex-presidente campeão brasileiro de 1995 e forte influenciador alvinegro, Carlos Augusto Montenegro. Com o antigo dirigente apoiando a Chapa Azul, de Thiago Alvim e Durcesio Mello, Simões ficou a maior parte do pleito conversando, evitando o corpo a corpo dele para atrair eleitores em General Severiano.

 

Pelos serviços prestados já na atual administração, Simões recebeu no mês de maio o título perpétuo de benemérito do Botafogo. Sua influência ultrapassa os muros da sede ou do estádio. Quando torcedores do Nacional-URU depredaram cadeiras, foi ele quem negociou a liberação com a polícia após o clube uruguaio pagar pelo estrago. E quando roubaram o carro de Jefferson, fez a ponte com a polícia, e o veículo recuperado foi levado para o goleiro no próprio Nilton Santos.

 

Elo com torcida

O dirigente é de origem das arquibancadas. Há quem diga que, muito tempo atrás, ele era membro de torcida organizada. Por sua raiz dos jogos e falar a “língua do grande público”, virou uma espécie de ponte entre diretoria e torcida. Nas festas que os alvinegros fizeram nas partidas da Libertadores esse ano, a parte estrutural era organizada e montada por ele e Márcio Padilha, vice de comunicação e marketing do clube.

 

Simões conversa com torcedores que invadiram gramado do Nilton Santos (Foto: Marcelo Baltar)Simões conversa com torcedores que invadiram gramado do Nilton Santos (Foto: Marcelo Baltar)

Simões conversa com torcedores que invadiram gramado do Nilton Santos (Foto: Marcelo Baltar)

 

Simões virou elo não só nos momentos bons, como também nos ruins. Em protestos, é o cara que acaba protegendo os jogadores e tomando à frente nos diálogos com as organizadas. Com seu jeitão “boleiro”, consegue amenizar o clima e intermediar os momentos de crise. Foi assim no último dia 18, quando um grupo arrombou o portão do Nilton Santos e invadiu o gramado, cancelando até o treino. O dirigente é que foi conversar com os torcedores e os convenceu a sair.

 

Nesta semana, membros de organizadas voltaram ao estádio, mas desta vez tiveram a autorização para entrar e ficaram cerca de duas horas conversando na sala do dirigente – onde a polícia encontrou dois facões durante apreensão. Segundo o clube, os torcedores foram saber o que poderiam fazer no jogo contra o Cruzeiro, neste domingo no Nilton Santos, para ajudar o time a voltar a vencer a conseguir a sonhada classificação para a Libertadores.

 
 

Amigos, amigos, negócios à parte. Durante os jogos, Simões costuma atuar junto da polícia nas arquibancadas e no Jecrim (Juizado Especial Criminal). No caso de injúria racial contra a familia de Vinícius Júnior, no clássico com o Flamengo, ficou até de madrugada no local para acompanhar. Ano passado, na Arena Botafogo, identificou um torcedor que atirou uma latinha no gramado. Na saída, um gol alvinegro o fez abraçar o torcedor na comemoração, depois terminou de retirá-lo.

 

Polêmicas

Embora não goste de aparecer, Anderson Simões vira e mexe se envolve em polêmica. Como por exemplo quando foi flagrado pelo “Jornal Meia-Hora” com um microfone no meio da torcida, durante a vitória por 4 a 2 sobre o Botafogo-PB, pela Copa do Brasil de 2015. O periódico o acusou de amplificar o barulho do público pelas caixas de som, mas na época o dirigente negou, alegando estar captando som para um projeto institucional do clube.

 

 

Vice de estádios virou capa do caderno de esportes de jornal em 2015 (Foto: Reprodução)Vice de estádios virou capa do caderno de esportes de jornal em 2015 (Foto: Reprodução)

Vice de estádios virou capa do caderno de esportes de jornal em 2015 (Foto: Reprodução)

 

No mesmo ano, caiu em outra polêmica, desta vez com o Fluminense. Após uma entrevista do então presidente tricolor, Peter Siemsen, criticando uma aproximação do Botafogo com a Ferj, Simões fechou as portas do Nilton Santos para o rival até haver uma retratação – na época, o time ainda usava com frequência o estádio para partidas como mandante. E ainda alfinetou:

 

– Se quiser, jogue em Xerém.

 

Mas seu maior alvo de provocações sempre foi o arquirrival Flamengo. Seja em resenhas ou entrevistas, Simões não perde a chance de cutucar o “clube lá da Gávea”, como prefere dizer. Por exemplo: durante apresentação da nova cara do Nilton Santos no início do ano, alfinetou o “cheirinho de hepta” que a torcida rubro-negra criou em 2016 e a falta de estádio do rival:

 

– Agora é acabamento. É perfumaria, né? O pessoal gosta muito de usar essa palavra “perfume”. Como a gente tem estádio, pode personalizar, customizar e deixar ele com cheirinho de novo (risos).

 

Em maio, foi a vez de aparecer em um vídeo no Aeroporto do Galeão, ao lado de Alexandre Brito, vice de esportes gerais, e um grupo de torcedores botafoguenses, provocando o time sub-20 do Flamengo que embarcava para a Europa. Enquanto os garotos passavam uniformizados, Simões e companhia começaram a cantar “cheirinho, gostoso, cadê, cadê você?”.

 

Entenda o caso

A operação “Limpidus”, da Polícia Civil em conjunto com o Ministério Público e o Juizado Especial do Torcedor, investiga a relação de clubes do Rio de Janeiro com organizadas e cambistas. Simões está entre os envolvidos e prestou depoimento na manhã de sexta-feira. A Justiça determinou o afastamento do dirigente de suas funções, mas o Botafogo ainda não cumpriu a determinação alegando não ter sido notificado.

 

Simões foi levado de sua casa em Copacabana, na Zona Sul, para depoimento na Cidade da Polícia, em condução coercitiva, de acordo com relatório. Uma viatura esteve no Estádio Nilton Santos logo nas primeiras horas da sexta-feira e fez apreensões na sala do dirigente. Entre os objetos levados estão dois facões. Nos bastidores, o clube o defende.

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