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18/11/2017 11h11 - Atualizado em 18/11/2017 08h40

Tricampeão, Niki Lauda elogia Hamilton: “Pilotou como um Deus este ano”

Ainda diz que Max Verstappen vai ser campeão mundial em breve

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Globo Esporte

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No início de 2012, Niki Lauda intensificou o assédio a Lewis Hamilton, piloto da McLaren. “Disse que em termos de futuro tínhamos muito a oferecer a ele.” O ex-piloto austríaco, três vezes campeão do mundo, sócio da equipe Mercedes, dizia a quem desejasse ouvir que tentava convencer Hamilton, então campeão do mundo de 2008, a se transferir da McLaren para a Mercedes.

 

Lewis Hamilton e Niki Lauda  (Foto: Getty Images)Lewis Hamilton e Niki Lauda  (Foto: Getty Images)

Lewis Hamilton e Niki Lauda (Foto: Getty Images)

 

Foi constrangedor para ninguém menos de Michael Schumacher, o companheiro de Nico Rosberg em 2012 na Mercedes, pois Hamilton viria para o seu lugar, em 2013, por Schumacher não estar mais, aos 44 anos, nos planos do time. “Estava ou não certo quanto a Lewis?”, perguntou Lauda ao repórter do GloboEsporte.com, na sexta-feira do GP do Brasil, em Interlagos, enquanto almoçavam.

 

O austríaco lembrou os mundiais vencidos por Hamilton com a própria Mercedes em 2014 e 2015, mas principalmente o desta temporada, o quarto da carreira, definido na corrida disputada na Cidade do México, dia 29.

 

“Este ano, Lewis venceu o campeonato para a Mercedes, simples assim. Nós não temos o melhor conjunto chassi-motor, quem tem é a Ferrari. Eles começaram o ano muito bem, melhor do que nós. E agora a Red Bull chegou também. Mas Lewis se apresentou como nunca, com poucos ou nenhum erro, pilotando como um deus, e nos deu o título.”

 

Niki Lauda  (Foto: Getty Images)Niki Lauda  (Foto: Getty Images)

Niki Lauda (Foto: Getty Images)

 

Toto Wolff, sócio e diretor da Mercedes também, entende da mesma forma. Em entrevista exclusiva ao GloboEsporte.com, no México, afirmou: “Lewis está pilotando mais que o carro. É o maior piloto com quem eu já trabalhei.” É por isso que não escondeu desejar renovar o contrato que acaba no fim de 2018. “Queremos muito que siga conosco, claro.”

 

Depois da apologia dupla, de Lauda e Wolff, Hamilton pode pedir um contrato com valores ainda mais elevados que, provavelmente, será atendido. No compromisso assinado em 2015, de três anos, comenta-se no paddock que ganha 32 milhões de euros (R$ 121 milhões) por temporada, mais prêmios e os contratos pessoais de propaganda, o que elevam sua receita a cerca de 50 milhões de euros (R$ 190 milhões) por ano.

 

 

Hamilton pula para a liderança do GP do Brasil (Foto: Reuters/Ueslei Marcelino)Hamilton pula para a liderança do GP do Brasil (Foto: Reuters/Ueslei Marcelino)

Hamilton pula para a liderança do GP do Brasil (Foto: Reuters/Ueslei Marcelino)

 

Lauda explicou que o modelo W08 Hybrid é um carro particular. “Nós não sabemos as razões de, em alguns GPs, ir mal. E tampouco temos ideia do porquê em certos circuitos, como Silverstone, o carro ser imbatível.” Mesmo assim, disse, Hamilton conseguia ser rápido e mesmo constante, apesar da inconstância do W08 Hybrid. “Apenas pilotos multicampeões podem ser pilotos multicampeões, eles se tornam melhores GP após GP e ano após ano. É a única maneira de você fazer sucesso em todo esporte.”

 

O desfile de elogios a Hamilton prossegue: “Vencer um campeonato é fácil, se você tem o melhor carro. Vencer muitas vezes o campeonato é extremamente difícil e Lewis é mestre nisso. Ele soube se aproveitar muito bem do fato de, apesar de não termos o melhor carro, a sua confiabilidade ser extraordinária. E nós vimos (referindo-se às quebras das unidades motrizes da Ferrari) quanto essa questão é decisiva na F1”. As panes na unidade motriz da Ferrari de Sebastian Vettel nas provas da Malásia do Japão tiveram enorme peso na perda do campeonato.

 

Hamilton marcou pontos nas 19 etapas disputadas este ano. A última vez que abandonou por causa de problemas com o equipamento foi no GP da Malásia de 2016, quebra da unidade motriz, portanto há 24 GPs. “Construímos um carro de reações imprevisíveis, difícil de ser acertado para os pneus, com uma estreita faixa de temperatura onde funcionam bem, mas nossa engenharia de motores fez um trabalho perfeito”, falou Lauda.

 

 

Lewis Hamilton  (Foto: Getty Images)Lewis Hamilton  (Foto: Getty Images)

Lewis Hamilton (Foto: Getty Images)

 

Supertalento do piloto e carro confiável

Das 19 corridas realizadas, Hamilton ganhou nove e foi três vezes segundo, além de estabelecer 11 pole positions. “Eu dizia de Lewis se aproveitar da resistência do carro. Mas não é só isso, da maneira como foi apertada a luta com Sebastian, este ano, teria sido muito fácil ele tocar rodas com alguém, errar, abandonar, mas não. Recebeu sempre a bandeirada. A combinação da performance irretocável de Lewis com a durabilidade do nosso motor nos deu o título.”

 

O austríaco explicou que o desafio de engenharia foi imenso. “Para ser campeão diante de um adversário tão difícil como a Ferrari, tivemos de correr riscos, nossos motores estavam no limite máximo. “E você viu quantos motores usamos para Lewis e Valtteri (Valtteri Bottas, companheiro de Hamilton na Mercedes)? Estamos dentro do limite, nossos pilotos não foram punidos, algo notável.”

 

A entrevista com Lauda aconteceu na sexta-feira, em Interlagos, antes da sessão de classificação, no sábado. Naquele treino Hamilton errou no Laranjinha e colidiu contra a barreira de pneus ainda na primeira parte, o Q1. Como iria largar em último, a Mercedes trocou a sua unidade motriz, ultrapassando o limite de quatro. Mas Bottas vai disputar a última etapa do calendário, dia 26, em Abu Dhabi, com a quarta unidade.

 

Um tema muito discutido no paddock este ano foi a influência da saída de Rosberg da equipe e da F1 no desempenho de Hamilton. O piloto inglês é outro homem, mais em paz consigo mesmo. Antes, durante e depois das entrevistas faz brincadeiras, está quase sempre disponível para uma breve troca de ideias, algo novo para quem convive com ele.

 

Abandono de Rosberg

 

Nico Rosberg, Niki Lauda e Toto Wolff no título de Construtores da Mercedes, no Japão (Foto: Getty Images)Nico Rosberg, Niki Lauda e Toto Wolff no título de Construtores da Mercedes, no Japão (Foto: Getty Images)

Nico Rosberg, Niki Lauda e Toto Wolff no título de Construtores da Mercedes, no Japão (Foto: Getty Images)

 

Enquanto Wolff confirmou ao GloboEsporte.com, no México, que de fato Hamilton parece ter se libertado de algo que o atormentava, Lauda não vê relação entre o abandono de Rosberg da F1 e Hamilton disputar sua melhor temporada no mundial. “Tenho experiência de piloto. Explico: “Quando dois pilotos não se gostam, como Lewis e Nico, você dá tudo de si, você quer vencê-lo de qualquer maneira. E não vejo diferença na velocidade de Lewis, este ano, por causa de Nico decidir parar de correr”.

 

A diferença, comentou, está no ambiente do grupo. “No café da manhã, no jantar, não importa quando, a atmosfera é outra. Não há aquele negativismo que havia. A relação entre Lewis e Valtteri é outra, eles trabalham muito bem juntos, em uma equipe onde não há preferências. Para resumir, o melhor Hamilton que vimos não se deve, para mim, a ausência de Nico na F1.”

 

Elogios a Bottas

O respeito e a admiração de Lauda não se restringem a Hamilton. Bottas está tendo, segundo o sócio da Mercedes, participação muito boa para um estreante em time grande. Os pontos somados por ele (faltando uma etapa, 280 diante de 345 de Hamilton) foram decisivos para a escuderia alemã conquistar o título de construtores já no GP dos Estados Unidos, quatro antes do fim do campeonato, comentou Lauda.

 

Niki Lauda e Valtteri Bottas no GP da Rússia (Foto: Getty Images)Niki Lauda e Valtteri Bottas no GP da Rússia (Foto: Getty Images)

Niki Lauda e Valtteri Bottas no GP da Rússia (Foto: Getty Images)

 

“Você viu como ele começou muito bem o campeonato? Na quarta etapa já venceu (GP da Rússia). Mas, como falei, nosso carro é muito difícil de pilotar. Em pistas como esta (Interlagos) em que o W08 se torna mais previsível e não fere seu estilo, Valtteri vai muito bem. (Bottas estabeleceu a pole e terminou a corrida em segundo, a 2,7 segundos do vencedor, Sebastian Vettel, da Ferrari). Mas em circuitos onde seu estilo é bastante atingido pelas reações do carro, Valtteri enfrenta problemas. A falha é nossa, não dele.”

 

O trabalho de Hamilton vem à tona de novo. “Lewis foi capaz de tirar tudo do carro, mesmo sendo imprevisível e difícil, mas Valtteri não. É normal na F1 um piloto se ressentir mais que outro de um carro complexo como o nosso.”

 

E já que o assunto é piloto de talento, o nome de Jos Verstappen surge na mesa. Lauda fala primeiro: “Com tantos anos que tenho no automobilismo, Max é o piloto jovem mais fantástico que eu já vi, sem dúvida (Lauda, nascido em Viena, tem 68 anos e há 48 está de alguma forma ligado às corridas de carro). Max, 19, agora 20 anos, me impressiona, é agressivo, veloz. A única coisa que eu diria a ele é para manter os pés na terra. Ele tem uma tendência a perder o controle de si mesmo, mas se dominar esses impulsos pode ser um dos maiores pilotos que a F1 já conheceu”.

 

Sobre os novos donos da F1

O GloboEsporte.com muda completamente o tema da conversa. A F1 tem desde janeiro novos donos dos direitos comerciais, o grupo norte-americano Liberty Media, cuja primeira ação foi desligar Bernie Ecclestone do evento. Seus líderes, Chase Carey, diretor geral, Sean Bratches, comercial, e Ross Brawn, responsável por discutir com as equipes um novo regulamento, técnico e esportivo, já emitiram sinais de que pretendem mudar bastante a F1.

 

Niki Lauda (Foto: Reprodução/SporTV)Niki Lauda (Foto: Reprodução/SporTV)

Niki Lauda (Foto: Reprodução/SporTV)

 

Lauda demonstra preocupação com a nova realidade sugerida. “Precisamos dar um tempo para eles identificarem o DNA da nossa competição. Mas posso já dizer que para nós da Mercedes, e pelo que conversei outros times também, há coisas que preocupam. Uma delas é que eles reestruturaram a administração da F1, contrataram uma série de profissionais, ao custo de 70 milhões de dólares (R$ 230 milhões) por ano, o que pode significar menos dinheiro para as equipes. Nós não sabemos qual será o montante a ser dividido entre nós em 2018.”

 

A Formula One Management (FOM), controlada pelo Liberty Media, tem uma arrecadação anual de cerca de US$ 1,2 bilhão (R$ 4,5 bilhões). Uma parte é usada para as despesas da própria FOM, outra se destina a FIA e a fatia maior é distribuída aos times, segundo a classificação no mundial de construtores e tempo de existência na F1, dentre outros critérios. O custo da FOM já está 70 milhões de dólares maior. “Bernie sabia disso e sempre mantinha um grupo mais restrito na administração”, diz Lauda.

 

Mais sobre a questão financeira. “Nós já estamos em novembro. Em todo tipo de negócio você precisa saber, ter uma estimativa, de quanto vai receber no ano seguinte. E nós ainda não temos. Disseram que vão nos dizer em janeiro. Precisamos estar próximos deles e fazê-los entender as necessidades da F1.”

 

ross brawn, lewis hamilton, f1 (Foto: Getty Images)ross brawn, lewis hamilton, f1 (Foto: Getty Images)

ross brawn, lewis hamilton, f1 (Foto: Getty Images)

 

O repórter pergunta a Lauda se confia em Ross Brawn. Os outros dois líderes vêm da cultura norte-americana, muito distinta da forma de se fazer negócio da F1, mas Brawn é um engenheiro de sucesso, campeão do mundo com a Benetton e Ferrari e até como dono de equipe, Brawn GP. “Toda vez que conversamos, percebo que eles querem implantar o sistema da Nascar (Stock Car norte-americana, onde vários equipamentos são os mesmos para todos os competidores), para todos poderem vencer. Isso é o oposto da F1. Na nossa competição privilegiamos o melhor carro, os melhores projetistas e melhores pilotos em uma disputa livre. E essa é uma questão chave que Ross deveria saber por ele ter feito parte da F1.”

 

Brawn defende o teto orçamentário, todos teriam um limite de investimento, que não seria muito elevado, como os 300 milhões de euros (R$ 1,1 bilhão) gastos hoje por Mercedes, Ferrari e RBR, para permitir às escuderias médias e pequenas terem chance de lutar pelas primeiras colocações. Lauda opina: “Nós falamos de teto orçamentário há 50 anos. Sem problemas, aceito. Mas que seja algo planejado. Coisa do tipo, em cinco anos teremos de atingir determinado limite. É necessário ir devagar porque não há como dispensar 500 integrantes do time de um momento para o outro. Sempre ouvi falar desse teto de investimento, mas nunca ouvi como implementá-lo.”

 

O homens do Liberty Media falam em rever o critério de distribuição de dinheiro na F1. Carey já soltou balões de ensaio, ao dizer aos jornalistas que com os 70 milhões de dólares (R$ 230 milhões) que a FOM repassa a Ferrari, apenas por conta da sua história na F1, ajudaria duas equipes a se tornarem mais competitivas. Como pensa que os italianos vão reagir?

 

“Vamos ter de esperar até que eles sentem conosco e digam, de forma clara, o que desejam. A partir daí posso te responder. Hoje, não sabemos. Até agora tudo o que ouvi são coisas como a que você acabou de falar. É inútil discutir até eles nos dizerem o que pretendem fazer”, disse o sócio da Mercedes.

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