Rui Car
10/10/2017 12h30 - Atualizado em 10/10/2017 08h30

Vale tudo? Atleta amador sai da torcida e conquista cinturão de evento de MMA

Professor de muay thai, Luis Felipe Alvim faz estreia inusitada no MMA

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Estreante no MMA, Luis Felipe Alvim é o novo campeão meio-médio do JF Fight. A frase por si só não causa nenhuma surpresa, mas a história do atleta amador de 22 anos, sim. A 18ª edição do evento em Juiz de Fora (MG) teria Carlos Eduardo “Blade” x Claudinei “Kall” como luta principal. Horas antes do combate, entretanto, Kall desistiu da luta, já que Blade pesou 400g acima do permitido. A partir daí, uma narrativa quase cinematográfica se desenhou para Luis Felipe. Se pensava ir ao hotel que sediou o evento para vender brownies e assistir seus amigos em ação, ele acabou dentro do cage para conquistar o cinturão.

 

Luís Felipe Alvim finalizou Carlos Eduardo Blade com um triângulo aos 4:28 do R1 (Foto: Leonardo Fabri/divulgação)Luís Felipe Alvim finalizou Carlos Eduardo Blade com um triângulo aos 4:28 do R1 (Foto: Leonardo Fabri/divulgação)

Luís Felipe Alvim finalizou Carlos Eduardo Blade com um triângulo aos 4:28 do R1 (Foto: Leonardo Fabri/divulgação)

 

– O Blade, que foi adversário dele, iria lutar com o Claudinei Kall, mas bateu 400g a mais. Tínhamos normas, multa para o adversário, caso o Blade ganhasse, ele não iria levar o cinturão, mas o Kall não aceitou lutar de última hora. Como organizador do evento, para dar satisfação para o público, arrumei um substituto. O Felipe Silva (mestre de Luis Felipe e atleta do UFC) disse que tinha um atleta que estava preparado, ia lutar duas semanas atrás em Curitiba. Falei dos exames, o Luis Felipe disse que tinha no e-mail. Fechamos os valores, e falei: “Não tenho o contrato aqui, mas vou imprimir no hotel e mostro os termos para lutar no evento”. Fui lá correndo, mostrei para ele, fechamos a bolsa, ele leu, disse que estava tranquilo. Na luta, apanhou igual o Rocky Balkboa e, no fim, finalizou – disse Vagner Araújo, presidente do JF Fight.

 

Além de inusitada, a história de Luis Felipe escancara o amadorismo no MMA nacional. Ao pedir a luta no vestiário e apresentar exames feitos (a organização não os enviou à reportagem do Combate.com até a publicação da matéria) para outro evento no e-mail, pelo celular, à organização, e ser aprovado e liberado para lutar sem trâmites burocráticos necessários, o professor de muay thai se arriscou e, apesar do final feliz, o conto de fadas poderia ter sido um filme de terror.

 

– Realmente eu não tenho como te explicar essa coisa de exames porque quem cuida dessa parte é uma outra pessoa. Sei que tem exame de sangue e hepatite, alguns específicos. Ele me mostrou sim, com certeza. Eu conversei com o Luis Felipe, na mesma hora ele disse que tinha no e-mail dele. Ele tinha os exames. Vou pegar tudo com ele, porque vou levar o dinheiro dele, fazer ele assinar o contrato e aí pego os exames com ele. Ele me mostrou os exames por e-mail, só não me deu o papel dos exames – explicou o dono do evento.

 

Atleta estreou com o pé direito no MMA profissional (Foto: Leonardo Fabri/divulgação)Atleta estreou com o pé direito no MMA profissional (Foto: Leonardo Fabri/divulgação)

Atleta estreou com o pé direito no MMA profissional (Foto: Leonardo Fabri/divulgação)

 

O lutador admitiu que o acordo entre as partes foi verbal e que ainda não entregou os papéis com exames e nem sequer assinou contrato, muito menos seguro.

 

– Eu tinha feito os exames e a pesagem para a luta de duas semanas atrás. Eles aceitaram porque sabiam do evento, que minha luta tinha caído, expliquei tudo, mostrei os exames, pesei antes da luta. Como foi na correria, não assinei contrato nem seguro antes da luta, só aceitei as condições anteriores. O acordo, na hora, foi de boca. Mas recebi o cinturão e tudo certinho. Vou assinar hoje com a JF Fight e no próximo evento, no ano que vem, vou encabeçar o card, o Vagner (dono do evento) me disse que agora sou o cara da cidade (risos) – disse Luis Felipe.

 

Apesar da correria e do combate casado em cima da hora com um atleta amador sem lutas profissionais no cartel, sem pesagem oficial e sem preparação específica para a disputa, a organização em momento algum temeu pelo risco à integridade física dos lutadores. Ao defender o evento Vagner Araújo citou o mesmo seguro que Luis Felipe disse não ter assinado.

 

– Na verdade, foi a primeira luta dele, estreia de MMA no profissional, mas é um atleta de várias lutas no muay thai, só estreou na carreira de MMA. Tem várias competições no jiu-jitsu e muay thai. Se o atleta estiver preparado e eu souber que é um cara que tem disciplina, que tem anos de lutas, graduação no muay thai, acho que o Felipe é ponta preta no muay thai e faixa-roxa no jiu-jítsu (na verdade é faixa-azul), com certeza sim. Sendo um atleta, tendo vários anos na área, faria. Acho que todo evento tem riscos. Mas o meu evento, como tento fazer uma coisa totalmente segura, até o público que vai assistir é segurado. Faço seguro para todas as pessoas. Coloco médicos para o público, médicos para os lutadores, policiais militares na segurança, contrato equipe de seguranças particulares, faço tudo para que seja 100% seguro – argumentou.

 

Surpreso com a repercussão do episódio, o novo campeão narrou os fatos de seu dia de super-herói por acidente.

 

Luís Felipe Alvim pediu a namorada em casamento após a vitória (Foto: Leonardo Fabri/divulgação)Luís Felipe Alvim pediu a namorada em casamento após a vitória (Foto: Leonardo Fabri/divulgação)

Luís Felipe Alvim pediu a namorada em casamento após a vitória (Foto: Leonardo Fabri/divulgação)

 

– Confesso que não esperava essa repercussão toda, achei que ficaria só aqui na cidade. Foi tudo muito corrido, parecia filme, mesmo. Eu acordei tarde no sábado, comi um empadão, uma barra de chocolates e até dei uns goles de cerveja. Decidi ir com a minha namorada porque precisava ver meus amigos lutando. Aí que dei a ideia de fazer os brownies e vender porque o ingresso era caro (R$ 80) e estamos um pouco sem dinheiro. Ela disse que me ajudava a fazer mas não queria vender porque ela tem vergonha (risos). Cheguei no hotel na hora do evento e todo mundo já tinha entrado, dessa vez não atrasou como de costume. Pedi a um amigo meu que trabalhava na organização e ele conseguiu me vender os ingressos mais barato. Fui no vestiário falar com meu mestre e aí soube que o Kall não quis lutar porque o Blade tinha pesado 400g a mais. Ele (Felipe Silva) me perguntou se eu queria lutar, e então, pedi a luta. Eles preferiram buscar outro lutador. Ligaram para ele, e o cara não quis lutar. Então me ofereceram a luta e eu aceitei – narrou.

 

Dentro do cage, o combate foi emocionante. Maior e mais forte – em sua versão, diferente da organização, a luta foi em peso combinado, e o desafiante-novato pesou 70 kg -, Blade imprimiu um ritmo forte e muita potência nos golpes, mas, em um erro, perdeu o braço e foi finalizado. A glória de Luis Felipe Alvim, que teve até pedido de casamento aceito, foi completa.

 

– Com a luta já para acontecer, foi aquela correria, minha namorada foi na minha casa pegar meus materiais, short, protetor bucal, chegou em cima da hora e fui lutar. Eu só vinha treinando jiu-jítsu depois do evento no Paraná (Face the Danger 17) que minha luta caiu, duas semanas atrás. O Blade pesou 82 kg, já reidratado, e eu peso 70kg, sou peso leve. Lutamos em peso combinado. Os dois aceitaram. Eu queria muito lutar, entrar no cage de qualquer maneira. Ele (Blade) bateu no peito e disse que lutava. Meu mestre insistiu pela disputa do cinturão e o Blade aceitou. Acho que teve um certo salto alto dele, ele viu que eu era novo, iria estrear e acho que ele já estava contando com a vitória. Na luta eu apanhei bastante, mas consegui segurar o braço dele e finalizei. O hotel veio abaixo. Muita gente entrou para me abraçar, me levantar, eu mal conseguia respirar. Nunca vi um dono de evento vibrar tanto como o Vagner (risos). Aí foi só pegar o cinturão e comemorar. Pedi minha namorada em casamento ali mesmo e agora estamos noivos – contou.

 

Por fim, o presidente do JF Fight exaltou o evento e lembrou que grandes nomes do MMA brasileiro tiveram passagem pelo evento no início da carreira.

 

– O JF Fight é regulamentado, está no calendário da cidade, está na 17ª edição, é um evento tradicional. Já recebeu vários campeões, como o Rafael dos Anjos, Alex Cowboy, Hacran Dias… Vários lutadores famosos que lutam em grandes outros eventos lutaram aqui. Então tenho certeza que o JF Fight é uma porta para os lutadores do país. As pessoas que habitam o evento são vinculadas a instituições, mas o evento não. A arbitragem ficou por conta do pessoal do Douglas Aires (árbitro do Jungle Fight). O JF Fight dá toda a estrutura, segue todos os padrões para estar nos grandes eventos – explicou.

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