Rui Car
04/09/2018 13h25 - Atualizado em 04/09/2018 11h32

Maristela Stringhini, que foi arrastada por 800 metros após acidente em 2014 em Rio do Sul, diz que ainda aguarda justiça

Após mais de quatro anos, ela já passou por 53 cirurgias

Assistência Familiar Alto Vale
Texto: Helena Marquardt - Jornal Diário do Alto Vale

Texto: Helena Marquardt - Jornal Diário do Alto Vale

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A história de Maristela Strighini marcou o Alto Vale e comoveu pessoas de todo país. Ela foi arrastada por 800 metros após um acidente de trânsito em 2014, em Rio do Sul e teve que lutar para reconstruir o corpo e a vida, mas mesmo após mais de quatro anos e mais de 50 cirurgias, diz que ainda aguarda justiça.

 

Ela garante que as marcas do que aconteceu naquele dia 13 de abril, também permanecem na memória. A vítima, hoje com 43 anos, ficou entre a vida e a morte e tinha apenas 1% de chance de sobreviver, mas resistiu a todos os ferimentos e se considera quase um milagre.

 

“O meu caso foi um dos casos mais raros, porque até hoje não há quem tenha sobrevivido depois de ser arrastada por 800 metros e perder a parte frontal inteira do corpo. No começo a gente não sabia como iria ser, se eu ia conseguir colocar silicone, tirar a pele ou melhorar a questão estética. Primeiro tentaram me salvar, depois começaram a mexer no rosto que quebrou todo e depois os médicos iam se reunindo para estudar o que podia ser feito”.

 

Ao todo ela já passou por 53 cirurgias em todo o corpo e ainda precisará fazer diversos procedimentos, mas agradece aquilo que ela mesma considera de uma nova chance.

 

Questionada sobre o que mudou após o acidente, Maristela foi enfática ao dizer que sua vida foi totalmente transformada: “Mudou tudo. Desde padrão de vida, até a vida pessoal mesmo”.

 

Foto: Arquivo pessoal

 

Ela diz que precisou se adequar a um novo padrão financeiro e hoje depende da ajuda da família para se manter.

 

“Na época do acidente falaram que iam pagar todas as despesas, mas não foi o que aconteceu. Eu tinha o meu negócio, mas não puder mais trabalhar, tive que vender carros para pagar gastos com tratamento, com viagens para ir ao médico. Hoje nem a escola da minha filha consigo mais pagar, voltei a ser dependente da minha família”.

 

Maristela diz que mesmo depois de tanto tempo sofre com as sequelas deixadas pelo acidente. “Minha face foi afetada, eu precisei colocar aparelho, perdi a mobilidade, o movimento da mão, do braço que ficou comprometido.

 

Hoje não consigo nem girar o trinco de uma porta. Tenho várias limitações e preciso conviver diariamente com a dor. Meu joelho foi refeito, as cicatrizes doem, e minha vida gira em torno disso. Hoje tenho dificuldade para tarefas simples do dia a dia como, por exemplo, dirigir, por isso tenho que usar o carro da minha família que é automático”.

 

Além de todas as consequências físicas, ela relata que também permanece com marcas psicológicas e precisa lutar contra a síndrome do pânico e depressão, mas ressalta que a maior dificuldade é aceitar a demora para que a história tenha um ponto final. “É uma questão de justiça para que ele não faça isso com outras pessoas, mas onde esta a justiça da terra? O que mais me revolta é essa lentidão. Hoje eu vejo que para eles era muito mais fácil eu ter morrido, iam pagar uma indenização para minha filha e eu não ia estar aqui para provar o que aconteceu”.

 

Após o acidente, Maristela ingressou com dois processos contra motorista que é acusado de ter causado o acidente, um cível e outro criminal, mas ressalta que o réu, Júlio Cesar Leandro, hoje tem uma vida normal.

 

“Ele terminou a faculdade e nunca foi afetado como eu, meu corpo, eu perdi toda a pele da parte da frente, hoje não me acho mais uma pessoa normal. Uma mulher que perde os dois seios, que fica com o corpo inteiro em pedaços, não se sente normal. Não vai ter dinheiro no mundo que pague isso”.

 

Desde a fatalidade ela revela que nunca conversou com o acusado, apenas com a família dele, por quem alega ter sido ameaçada para desistir do processo. De acordo com Maristela, hoje ela tem uma dívida de R$ 700 mil com o médico responsável pelo tratamento. “Eles [a família do acusado] só queriam pagar se eu desistisse do processo, como não desisti não pagaram a dívida”, relata.

 

Questionada sobre qual é o fim esperado para o julgamento, a lageana comenta que o principal objetivo não é o ressarcimento financeiro, mas sim a justiça.

 

“Quero que ele vá a júri popular e não interessa quantos anos de cadeia ele vai pegar, ele nunca vai sentir 1% da dor que eu senti”, desabafa.

 

Foto: Arquivo pessoal

 

Os processos

Atualmente o acusado de ter arrastado Maristela, Júlio César Leandro responde a dois processos envolvendo o caso: um cível e outro criminal, mas em ambos ainda não houve um desfecho.

 

De acordo com o advogado de Maristela Strighini, Luiz Vicente de Medeiros, o criminal aguarda uma decisão do (STJ), em Brasília, sobre um recurso impetrado pela defesa de Júlio César Leandro tentando evitar que ele seja julgado pelo Tribunal do Júri. “Estamos brigando lá para que ele vá a júri popular”, explica.

 

Ele também reclama da demora para o julgamento e diz que normalmente a sentença é dada de forma mais rápida no STJ, no entanto, diz estar confiante com um parecer favorável a Maristela.

 

“Estou aguardando, confiando na justiça. Eles têm bons advogados, mas não vão mudar a história, porque isso foi uma tentativa de homicídio qualificada. Ele tentou matar ela e as provas estão ali e não serão mudadas. Ele foi avisado que tinha uma pessoa debaixo do carro, ele fez ziguezague e ele não parou para socorrer, então ele queria matar e vou sustentar isso no dia do julgamento”.

 

Já o advogado de Defesa de Júlio César Leandro, o criminalista Claudio Gastão da Rosa Filho, alegou que já em 2015 conseguiu derrubar as qualificadoras que pesavam contra o jovem e poderiam acarretar em uma pena de até 30 anos de prisão. Agora ele responde por homicídio simples e poderá receber pena mais branda, entre seis e 20 anos de prisão.

 

 

“Mas o Ministério Público não se conforma com a vitória que a defesa teve aqui no Tribunal de Justiça e mesmo depois de nós termos pedido para marcarem o júri não quiseram fazer. Queremos que seja marcado o quanto antes porque temos interesse em resolver isso”.

 

Na época em que o recurso foi aceito pelo TJSC ele já havia concedido uma entrevista ao Jornal Diário do Alto Vale em que falou sobre o caso e alegou que tudo foi uma fatalidade.

 

“Ele não teve a intenção de ferir ninguém propositalmente e a dinâmica dos acontecimentos demonstra isso. O Júlio é um jovem de bem, que nunca se envolveu em nenhum outro crime. Logo após o acidente ele já foi preso e isso trouxe muito sofrimento não só para ele como para toda a família, que é bastante conhecida na cidade”, ressaltou.

 

Atualmente Júlio aguarda o processo em liberdade em função de um habeas corpus apresentado pela defesa.

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